Sobre o Projeto

O Programa Interinstitucional de Bolsas de Iniciação à docência (PIBID) é um programa do MEC, fomentado pela CAPES para o aperfeiçoamento e a valorização da formação de professores para a educação básica. Na UFPel, desde 2010, o curso de Teatro está participando, juntamente com os demais cursos de licenciatura. Atualmente somos um grupo de 12 alun@s do curso de Teatro - Licenciatura da UFPel, bolsistas do PIBID - CAPES/MEC. Desenvolvemos ações específicas da área de teatro e projetos educacionais interdisciplinares, no momento, atuando em quatro escolas públicas parceiras do programa, em Pelotas/RS, orientados pelas professoras/es supervisoras/es das escolas e pelos coordenadores de área.

segunda-feira, 30 de novembro de 2015

JOGATINA NA SALA DE AULA: DO JOGO À REFLEXÃO COM JOVENS ESPECTADORES

JOGATINA NA SALA DE AULA: DO JOGO À REFLEXÃO COM JOVENS ESPECTADORES.


DEMUTTI, Anderson Morais Demutti[1]


Resumo: A recepção e apresentação da peça teatral “Jogatina” que é um dos resultados da pesquisa Jogatina: aprendizagem em teatro pós-dramático e suas contribuições para a pedagogia do teatro, realizada na UFPel, serão abordadas neste artigo. Foram planejadas e executadas mediações com alunos do ensino médio em escolas da rede pública de Pelotas/RS, em um vínculo do projeto de pesquisa acima citado com uma ação do PIBID Teatro UFPel. O foco do texto estará na realização da mediação, desde o planejamento da apresentação nas escolas, até a recepção da mesma e o debate com os estudantes espectadores realizado após apresentação. A análise das declarações dos estudantes mostrará a transformação das suas expectativas acerca da linguagem teatral, a partir da ação realizada nas escolas.


Palavras-chave: Teatro; Espectador; Jovem;

INTRODUÇÃO

O trabalho aborda um relato das ações realizadas pelo PIBID teatro, e também uma reflexão do discurso do jovem para com a peça JOGATINA. Contribuindo para um dos objetivos da pesquisa, a pedagogia do Teatro.

DESENVOLVIMENTO E DISCUSSÃO

PESQUISA

A pesquisa Jogatina: aprendizagem em teatro pós-dramático e suas contribuições para a pedagogia do teatro, consistiu em colocar em prática o jogo de aprendizagem proposto por Bertold Brecht. As peças didáticas estudadas ao longo da pesquisa foram: Um Vôo sobre o oceano, Aquele que diz Sim Aquele que diz Não, A decisão, A Peça Didática de Baden-Baden sobre o Acordo, Horácios e Curiácios e A exceção e a regra.
Ao ler as seis peças foram elaboradas cenas a partir de trechos, estas poderiam ser fieis ou não ao texto. Outro objetivo da pesquisa é a montagem de uma peça a partir das cenas sugeridas nos encontros, assim surgiu à peça Jogatina.
Logo após a estreia no mês de julho do ano de dois mil e quatorze, para a comunidade acadêmica, o circuito de apresentações nas escolas foi planejado através da atividade prevista no projeto de área do Pibid teatro, Mostra de cenas:

Circulação de cenas, esquetes ou peças teatrais, produzidas nas disciplinas do Curso de Teatro-licenciatura e/ou pelos grupos teatrais formados pelos alunos do curso. Além de fomentar a recepção teatral nas escolas, a Mostra proporcionará aos licenciandos, experiência em produção cultural para a escola, oportunidade de apresentação pública de trabalho artístico e práticas de ensino voltadas à pedagogia do espectador. (NETTO, Maria Amélia Gimmler, 2014)




A PEÇA

A peça tem onze cenas (Vendas; Temos fumo; Cuidado imenso; Água nas asas; Nevasca; A menor dimensão; Travessia; Canção da mercadoria; Tudo vira pizza; Rastejar por água; As Cordas) são cinco atores e a orientadora Maria Amélia fica na mesa de audio-vídeo. O jogo de cenas tem a duração de em média de meia hora.
O espaço é um corredor de cadeiras e ficam à disposição vinte e cinco lugares de cada lado. Em uma extremidade fica um projetor e uma corda. As imagens são projetadas na extremidade inversa durante uma cena, neste canto onde as imagens são projetadas, utiliza-se de três caixas grandes de madeira dispostas uma ao lado da outra com um pequeno espaço entre a parede, dentro das caixas contém bolinhas e tiras de papel.
O figurino é uma calça preta e uma camisa lisa de manga longa também preta.
A cena inicial começa no lado de fora do lugar da apresentação,  no caso aqui os lugares foram, corredores das salas de apresentação. Na escola Felix da Cunha ocorreu na sala de vídeo e na Assis Brasil utilizamos a sala voltada para a prática de Ballet, nas escolas Simões Lopes e Sylvia Mello as cenas se realizaram na sala de aula dos alunos, aguardando os jovens espectadores se colocarem nos lugares.

A RECEPÇÃO DOS ESPECTADORES

Do mesmo modo que a mostra de cenas, a recepção da peça se deu pelo eixo do projeto de área do Pibid,  Escola de Espectadores tal ação visa, educar o olhar de alunos e professores do ensino médio para os espetáculos que virão a ser apresentados no eixo mostra de cenas, através de materiais e autores que focam em recepção teatral.
A equipe do Pibid composta por doze alunos auxiliou nas apresentações onde cada trio atuante nas quatro escolas, responsabilizaram-se por mediar a realização das aulas receptivas e a apresentação.
Os planos seguiram a seguinte metodologia de aulas: no primeiro encontro foram realizadas observações, apresentação dos bolsistas e conhecimento da turma, levando o convite para a apresentação da peça. No segundo encontro, cada equipe elaborou uma atividade com suas respectivas turmas. Na escola Sylvia Melo, por exemplo, utilizaram-se de um fragmento da peça “Aquele que diz sim, aquele que diz não” para uma atividade onde cada grupo de alunos deveriam ler e pensar em alguma proposta de cena ou imagem que aquele trecho do texto sugere, realizando uma organização de improvisação após esta leitura. Já no terceiro encontro foi o momento da apresentação seguida de debate.
De modo geral os planos sempre seguiram o objetivo de provocar no aluno um olhar mais crítico sobre as cenas e conteúdos abordados pela peça Jogatina. 
A recepção serviu de levar para os alunos os conceitos sobre a linguagem teatral, o papel do ator, do texto, dos objetos, da música, do figurino entre outros aspectos.
Foi observado nas escolas que boa parte dos alunos nunca tinham tido contato com o Teatro, a não ser esquetes na rua ou quando crianças algo que mal se recordavam. Jogatina foi então o primeiro contato de muitos com uma peça teatral.

APRESENTAÇÃO E DEBATE

No terceiro encontro, como previsto, ocorreram as apresentações nas escolas. A estreia no Instituto Assis Brasil foi a única que excedeu o limite de espectadores, pois contemplou três turmas do ensino médio, aproximadamente um público de sessenta espectadores, tornando a conversa sobre a peça um tanto agitada contrário das outras apresentações e debates, pois os outros contemplaram apenas uma turma de cada escola tornando a conversa mais focada e prazerosa, deixando os alunos mais descontraídos.
Nos debates foram levantadas várias questões sobre os conteúdos que a peça expunha como a forma que se elaborou a peça por completo, as questões políticas e de divisão de classes sociais, a questão do homem com a natureza, o sentimento de medo provocado por algumas cenas, que estava presente em todas as conversas e o uso de objetos como as bolinhas de papel e a corda.

RELATOS

Só que não entendi a hora que vocês estavam dançando e estava passando umas imagens, meio triste. Eu não entendi parecia que vocês estavam festejando e estava passando uma coisa muito ruim ali.
Eduarda.

Eu senti, mas eu vi que isso é o Brasil, por que é sempre assim, ta acontecendo um monte de coisa ruim, mas, parece que eles não veem. Não sei explicar, ta acontecendo um monte de coisa e... As pessoas sem casa, agora mesmo, um monte de gente com a casa alagada e pra isso não tem dinheiro, mas, pra fazer a copa tinha
Ketelen.

Como eles apresentaram, é pra interagir junto e não só, ficar olhando. O teatro é uma arte, tem que interagir junto e fazer todo mundo se sentir bem.
Erick

Pra mim o texto me chamou a atenção. Ele quer superar algo, achei interessante.
Gabriele.

Parece que quando, ele coloca assim a corda, parece que ela vai enforcar ele, daí eu senti medo seria um negócio chocante. Fiquei com medo o tempo todo.
Sem nome.

O que era aquelas bolinhas, quando ela estava correndo era neve?
Ketelen.

Eu achei bem agitado. Não dói? (referindo-se quando atores se jogam no chão) Por quanto tempo vocês ensaiaram a peça?
Bruna.          

Bem no início que vocês vem aqui pra frente, me senti desconfortável com medo, mas foi legal. Fiquei angustiada, uma sensação de medo por que a gente leu o texto e ficou aquilo na cabeça ai na hora eu fiquei imaginando.
Manuela.

Assim eles já tinham falado, que o autor (Brecht) que as cenas têm uma certa aproximação e agente fica prestando a atenção aí, do nada acontece uma coisa louca e a gente se afasta, isso aconteceu quando ela tava correndo e ficou congelada, aí fiquei... Que? Aí vem outra cena e fica mais maluco ainda. Tira o raciocínio lógico da coisa.
Natalia.

Por que só o Ensino Médio e não o fundamental?
(sem nome)

É que o normal é ser uma peça organizada e tudo certinho, aí do nada te levantam, se fosse outra peça não saberia lidar, é diferente isso é uma coisa que chama a atenção.
(sem nome)

Eu vi a torcida, por que a gente é de torcida daí prestamos mais a atenção.
Bruno.

Acho que passa bem a realidade por que tem dias que a gente esta triste, mas por mais que o dia seja ruim, a gente não esquece de se divertir e aproveitar nos dias bons. A gente está aqui conversando uma coisa boa e pode estar sofrendo muitas pessoas lá fora... e é a vida.
(Sem nome)

Eu nunca tinha visto uma peça de teatro assim. Todas as peças de teatro que vi eram tudo igual e ai essa é diferente e gostei, nunca me interessei por teatro gosto mais da dança e da música e agora vi essa e é diferente gostei.
(Sem nome)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao transcrever as falas dos alunos, foi constatado que a peça Jogatina serviu de grande experiência para a formação dos jovens espectadores.  O primeiro aspecto que ressalto é da qualidade da peça em seus diversos âmbitos, interpretação, texto, objetos cênicos, desconstrução do ambiente escolar etc.

Um teatro em que a exigência seja fundamentalmente artística, com tudo o que a arte pode oferecer de incômodo e desestruturador. É desejável, portanto, que os produtores culturais lutem pela liberdade de conceber espetáculos dotados de capacidade, inerente à obra de arte, de abalar as certezas costumes dos espectadores. (DESGRANGES, Flávio 2003)

Durante as aulas mediadoras, boa parte dos alunos não sabia descrever como era a peça ou esquete já vista por eles, seja na rua ou no prédio de teatro, ou então ressaltavam que a peça era chata. Por isso fazer aula antecipadamente para as turmas enriqueceu no entendimento da obra, tornando assim o primeiro contato instigante e revolucionário. Ajudando também para a concretude da peça, pois no momento a Jogatina não estava acabada e as críticas levantadas somam.

Entre atores e espectadores tece-se uma relação corporal e espacial; possibilidades de interação e participação são sondadas, de modo que o público, por vezes incomodado, possa reavaliar sua própria concepção de arte. O teatro é afirmado mais enquanto processo do que como resultado acabado, mais como ação e produção em curso do que como produto. (PUPO, Maria Lúcia 2006).

A linguagem Pós-dramática da jogatina também contribui para uma visão mais crítica do jovem para com a peça, ao pensar sobre as reflexões que as cenas causam, entende-se que a recepção e a apresentação possibilitaram que os alunos vissem as relações humanas de forma crítica e relacionassem com o seu cotidiano, reforço que na maioria das vezes as peças vistas pelos alunos eram comerciais ou com fabulações sem contexto social nenhum.
Contrário do que diz Lehmann ao falar da escolha de profissionais da área pela abordagem Pós-dramática para lidar com as situações, e o teatro deve ser considerado como uma situação e sua estética devem derivar desta. (Lehmann, 2013).
Outro aspecto é do ambiente escolar possibilitar esta experiência, pois como a maioria dos alunos exceto alguns que até fazem teatro em grupos da cidade, nunca tinham visto ou parado para ver uma peça, então a escola como espaço para a prática e contemplação deve cumprir este papel, pois ao notar a mudança do pensamento sobre o a arte, os jovens demonstraram interesse perguntaram se teria outra aula ou onde poderiam ver mais, é neste sentido que a educação em teatro ganha força, quando o conhecimento sobre tal coisa muda sua visão sobre a mesma, fazendo efetivamente mais espectadores e seres pensantes no ambiente teatral e das artes, contribuindo para a escola e para que a cultura das artes seja recepcionada e apreciada de maneira divertida e reflexiva.
Concluo que poderíamos ter continuado o trabalho de educação com os espectadores, em prolongamento onde os adolescentes teriam uma aula mais especifica na prática para assim, fazer e entender ainda mais o jogo das cenas, fazendo com que eles vissem que teatro também pode ser feito por amadores, professores, estudantes entre outros, como afirma Brecht.

A peça didática ensina quando nela se atua, não quando se é espectador. Em princípio não há necessidade de espectadores, mas eles podem ser utilizados. A peça didática baseia-se na expectativa de que o atuante possa ser influenciado socialmente, levando a cabo determinadas formas de agir, assumindo determinadas posturas, reproduzindo determinadas falas. [...] a forma da peça didática é árida, mas apenas para permitir que trechos de invenção própria e de tipo atual possam ser introduzidos (BRECHT apud KOUDELA, 2007).


REFERÊNCIAS


DESGRANGES, Flávio. Pedagogia do Espectador. São Paulo: Hucitec, 2003.

PUPO, Maria Lúcia.  Sinais de Teatro-Escola, Humanidades, 2006.

LEHMANN, Hans-Thies. Teatro Pós-Dramático doze anos depois, 2013.

KOUDELA, Ingrid. Brecht: um jogo de aprendizagem. Perspectiva. São Paulo. 2007.

NETTO, Maria Amélia Gimmler. Proposta de subprojeto, Pibid-Teatro, 2014.




[1] Graduando, Ufpel e Andersondemutti100@hotmail.com

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